29 julho 2015

Dias de Ao Revés e de Goiaba - Por Ana Garbuio (AnaGê)


 Entre idas e vindas de Ao revés do papel, espetáculo que o Grupo apresenta desde 2012:

No evento do Gaveta Livre, o espetáculo foi apresentado  depois de diversas mesas de conversas, com escritores que inclusive admiramos muito - um turbilhão de energias vindas de um público, que ocupou tantos espaços no teatro do Gaveta, que pude me sentir quente, sendo bem recepcionada e podendo fazer com muito furor e alegria o Ao revés!

Em Matão, para crianças, que atentamente assistiram à histórias de Lia, Sr. Ricardo e Ana Zulmira, para um bebê que chorava em uma cena que pudesse lhe dizer respeito, além da cachorrinha que se assustou com os gritos guturais do inicio do espetáculo. E nos olhares infantis e discretos, a descoberta do que contamos e do que toca, de alguma forma ou de outra.

Na fundação Casa, para meninos que após o espetáculo estavam com muitas perguntas na ponta da língua, uma delas e a que talvez seja mais difícil de responder: Dá pra viver de teatro?
Mais uma vez, havia olhares de quem estava curioso, pronto para a piada certeira e digna de risos maliciosos e efusivos, em cada canto da plateia, o que toca é dito e, quem faz, ouve.

Com a Goiaba, uma cena sobre uma outra questão da cidade, dessa vez não contada através de histórias orais, e portanto não carregada de ilegitimidade, já que lendas urbanas são tratadas somente como lendas urbanas. Esta história foi filmada, nosso primeiro contato com ela foi pelo Youtube:

No Festival Se Vira São Carlos, ela veio com tudo e com muita gente, na Praça Pedro de Toledo, entre outras coisas, estávamos em um evento que representava resistência à uma conjuntura política ruim em que a cidade vive: a Prefeitura pouco faz pela Cultura da cidade. Nisso a cena se movimentou, o evento aconteceu, entremeado ao Sol, aos produtores e artistas da cidade e à nossa Goiaba.

Quando voltamos para a Fundação Casa, desta vez com a Goiaba, o prefeito não pode ver, por ser muito compromissado e com agenda lotada, afinal é uma figura pública, não é mesmo? Já que enfrenta tantas mazelas sociais na cidade e, por isso tem mesmo é que correr - correr muito, já que está próximo ao ultimo ano de mandato - contra o tempo e, não ver uma cena de 12 minutos.


Além de todas as experiências com Ao revés e Goiaba, falar de "Sapateira" é passar por todas essas experiências e lembrar de Marcelino Freire lendo seu conto do livro "Amar é crime", trecho que leu no Festival Gaveta Livre:

"Ricas Secas

Não somos pobres
Nós somos ricos
Não temos planícies avermelhadas nem juazeiros
Não somos infelizes
São Paulo é a cidade da felicidade.
Ah, esse sufoco logo passa. Nós temos dinheiro. Nós temos o poder. A gente é capaz de mandar engarrafar. E trazer. Tudo que é correnteza. Mudar um rio de lugar. Pode crer.
A gente paga tecnologia japonesa.
Italiana, escocesa.
A gente estuda. A gente não é analfabeto. Nem atrasado. A gente não é ignorante. A gente não vai dar o braço, o pano, a toalha a torcer. O governo, daqui, faz chover. Por isso essa calma. Por isso a gente não alardeou.
Pra quê? Pobre é que gosta de grito. A gente é educado. A gente não se escancara feito um esfomeado.
Nossa seca não é seca. É crise hídrica. É outra coisa. Viu algum jumento, por aqui, agonizar? Viu cachorra reclamar?
Nos Jardins, os cachorros continuam a passear. E a cagar. Como se nada, ao redor, estivesse acontecendo. E nada, de fato, está acontecendo. É preciso se concentrar. Manter a postura.
Nós temos classe. Nossos jardins continuam sendo jardins. Alamedas. E vou dizer mais umas coisa. Numa boa, sabe quem trouxe essa desgraça pra cá?
Os nordestinos [...]"

Um trecho que revela um pouco de cada elemento que resgatamos para nossa "Sapateira", sendo estrangeira, também chamada de Sapo de Fora -nome inclusive de uma das nossas cenas que apresentamos, junto com a Goiaba! 
Alias, os grifos são meus!