11 maio 2015

... Enquanto isso

O PB treina e vive um processo de montagem como nunca viveu antes. Tudo por causa do PROAC - prêmio ($) conquistado neste início de ano, o qual nos possibilitou trabalhar com novas pessoas (diretor convidado, cenógrafo, cenotécnico, figurinista, músico, iluminador, etc). Novas pessoas e um PRAZO. Montar um espetáculo depois de ficar um ano "treinando" (vide significado de treinamento na postagem anterior) - como seria? Vivendo o 5º mês do processo, exatamente a metade, ainda compreendendo coisas do início...de 2014, 2013, 2012, 2011, 2010, 2009, 2008...
Enquanto isso, o elenco e direção do grupo continuam suas vidas de espectadores, e foram assistir grandiosos espetáculos. Abaixo segue dois relatos simples de duas peças que assisti: "Por Elise", do Grupo mineiro Espanca! e "O Terno", direção de Peter Brook.
O primeiro assisti no SESC Ipiranga, parte da programação de comemoração de 10 anos do grupo, que apresenta também outros espetáculos do repertório. Em cena, cinco atores e abacates que caem de uma árvore invisível. As cinco histórias se entrelaçam enquanto os abacates vão caindo. Destaco a atuação da Grace Passô, que também dirigiu e escreveu a peça. Depois da primeira cena, em que sozinha conta histórias curtas e inusitadas, de maneira brilhante, deu medo de como seria o restante. E foi lindo! "Por Elise" vale muito a pena.

por elise


Já "O Terno" (SESC Pinheiros), espetáculo do afamado diretor inglês Peter Brook, conta a história de uma mulher que trai o marido. Ele flagra a situação e na fuga, o amante deixa seu terno. A partir daí, ele obriga a mulher a dar vida ao terno e a trata-lo como uma ilustre visita.
Em cena, três atores e três músicos abusam da simplicidade para contar a história, e para isso, se sustentam numa base técnica  que impressiona. O trabalho vocal e a intensidade e precisão dos movimentos chamam a atenção.

o terno

E serão muitos outros espetáculos, filmes, notícias, comentários do leitor, ensaios, intensivos, leituras, eventos abertos, oficinas, pular corda, jogar bolinha, exercícios do método Suzuki, viewpoints, ufa! Estamos em montagem! De qualquer maneira, estrearemos em outubro. É o prazo, pois o tempo, ah, o tempo... O tempo é relativo.

Fernando Cruz
11/05/2015






10 maio 2015

relato semanal - por Nádia

São Carlos, 10 de maio de 2015.

Como vai?
Desde nosso último contato temos seguido seus conselhos e nossas intuições. Afora as tretas comuns, as raivas momentâneas, os desânimos repentinos, as revoltas instantâneas, o não ouvir o que nos é alheio, o sucumbir à tentação de emburrecer o outro, as tentações egocêntricas, de resto, temos nos dado muito bem. Veja as fotos nos álbuns que tele transferiremos a seguir. Só sorrisos e biscoito de polvilhos.
Mas há uma única crise. O que será correspondido com sim e o que será correspondido com não? Temos tomado muito chá de artemísia estelar, mas a criatividade sempre se apresenta com receio. Temos treinado, mas não entedi ainda muito bem o que isso é. Nem como isso fará de meu corpo feio o instrumento das mensagens que queres. Queremos.
No mais, só maravilhas. Teatro é tão bacana. Tão recreativo!  A política é que... bem... falemos mais em breve.
Obrigada por tudo.
N.


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Diauarum, 11,3 de factóis de 1.789.900

Ao caso.
Usamos o termo "treinamento" em nossos relatos em alusão aos exercícios que atores fazem, individual ou coletivamente. Vocês chamam aí de "exercícios de base" e achamos interessante tal apropriação. Supomos que vocês saibam que a conexão com a terra, com o centro do corpo e com a respiração - que são a finalidade dos exercícios passados para vocês - são a base da construção deste espetáculo. Também indicamos que continuem a fazer os exercícios separados em grupos, possibilitando que um assista ao outro. Observar também é estudo.
O treinamento dá ferramentas para desenvolver uma técnica e, depois, uma competência. Saber trocar marchas de um carro, acender os fárois, conhecer as leis de trânsito do seu planeta, ter boa coordenação motora, te fará habilitado a dirigir um carro. Não fará  de você um bom motorista, necessariamente.
Ve-los pular corda por horas chega a nos dar inveja, já que não temos mais a matéria. Bem como unir um texto lorquiano a um exercício japonês. Mas não pirem em demasia. Não achem que queremos que vocês fiquem rijos no palco. Não. Nem os próprios exercícios exigem mais rigidez que criatividade. É na criatividade que vocês devem criar suas moradas. Também esteja atenta: criatividade não é esculacho. E ainda que use da frequência vibratória da loucura, não a é.
Não se esqueça também que o treinamento não aponta apenas as limitações do corpo e voz. Mas, no seu caso, aponta para as limitações de sua coragem para colocar o corpo na dança da arte.
Não fuja! Ou você continuará atrofiando seus quadris e engordando os braços? Pare de achar que essa gritaria resolverá a cena, não vai. Queremos algo diferente disso tudo que vocês fazem aí na Terra. Existem violências silenciosas, facas pequenas também matam (é delas que vocês estão morrendo aí no Brasil).
Vocês tem lido jornal como ordenado? Acompanhado os noticiários da TV? Participado de assembléias o suficiente? E nas filas dos postos de saúde, frequentemente? Ouçam mais, por favor.
O triplo! Temos um prazo, temos um  plano. Nós, do outro plano, estamos sempre atentos.

Ordenaram terminar com um trecho de Yoshi Oida em "O ator invisível"
"(...)
Interpretar, para mim, não é algo que está ligado a me exibir ou exibir uma técnica. Em vez disso é revelar, por meio da atuação, "algo mais", alguma coisa que o público não encontra na vida cotidiana. O ator não demonstra isso. Não é visivelmente físico, mas, através do comprometimento da imaginação do espectador, "algo mais" irá surgir na sua mente. Para que isso ocorra o público não deve ter a mínima percepção do que o ator está fazendo. O espectador tem que esquecer o ator. O ator deve desaparecer. 
No teatro kabuqui, há um gesto que indica "olhar para a lua", quando o ator aponta o dedo indicador para o céu. Certa vez um ator, que era muito talentoso, interpretou tal gesto com graça e elegância. O público pensou "Oh, el fez um belo movimento!". Apreciaram a beleza da sua interpretação e a exibição de seu virtuosismo técnico.
Um outro ator fez o mesmo movimento; apontou a lua. O público não percebeu se ele tinha ou não realizado um movimento elegante; simplesmente viu a lua. Eu prefiro esse tipo de ator: o que mostra a lua ao público. O ator capaz de se tornar invisível. (...)"

Continuem.
Z.